Abaixo, carta de jurístas em apoio à ocupação Novo Pinheirinho, em Taguatinga-DF escrita pelo B&D e pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto. Para assinar, basta comentar abaixo nesse post.
Saiba mais sobre a ocupação:
MTST ocupa prédio abandonado em Taguatinga
Quando morar é um privilégio, ocupar é um direito
Carta de Apoio dos/das Juristas à Ocupação Novo Pinheirinho, do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), em Taguatinga-DF
A Constituição da República, promulgada em 1988, ganhou o apelido de Constituição cidadã por elencar os direitos e as garantias fundamentais como principais balizadores do projeto político que é uma Constituição, e, sobretudo, pelo caráter democrático de seu processo constituinte, marcado por intensa participação popular, de diversos setores organizados da sociedade. O compromisso com a efetivação integral e indivisível dos direitos, dever jurídico de todos os poderes estatais, exige uma atitude de abertura, sensibilidade e reconhecimento ao papel da cidadania ativa, aos processos públicos de luta por direitos fundamentais, pois neles reside a força social capaz de fazer valer as promessas inscritas no texto constitucional. “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”, nos termos da nossa Carta Maior.
Entende-se hoje, tanto na doutrina quanto na Jurisprudência, que a Constituição tem força normativa, devendo haver esforços contínuos do poder público para efetivá-los. Se o Estado, por um lado, não respeita nem faz respeitar os direitos fundamentais, e, por outro, reprime os cidadãos e movimentos que lutam pela sua garantia, produz-se uma situação de duplo esquecimento e violação do projeto constitucional de um Estado social e democrático de Direito.
Morar em condições dignas, assim como ser educado e ter acesso à cultura, não pode ser privilégio de alguns. Como nos ensinam a Constituição e o Estatuto da Cidade, o uso da propriedade deve cumprir função social. Para que essa função seja realmente cumprida e pare de ser um enunciado elegante que simplesmente adjetiva uma compreensão absolutizadora de uma leitura exclusivamente individualista e egoística do direito de propriedade, ela deve ser lida a partir de todas as garantias fundamentais, já que elas são condições de possibilidade para a realização do estado democrático de direito. Faz-se necessário, portanto, diferenciar legítimos direitos de propriedade de pretensões abusivas relacionadas a ele, isto é, do abuso do direito de propriedade para utilizá-la contra a sua função social. Trata-se de levar nossa Constituição a sério, para além de interesses econômicos antijurídicos que pulverizam direitos e destróem comunidades em nome da especulação imobiliária e outros fins antissociais, a contrapelo das obrigações assumidas pelo Estado nos planos do direito constitucional, internacional e urbanístico.
Em último caso, na hipótese de o despejo de centenas de famílias pobres mostrar-se absolutamente inevitável, isso não pode ocorrer sem a prévia garantia concreta, a todas e cada uma delas, de condições adequadas de moradia. O contrário seria afirmar que o direito de propriedade, concebido de maneira individualista e egoística, seria superior ao direito à moradia, hierarquização que não encontra agasalho no nosso direito.
Para que o Brasil deixe de ser uma nação de poucos, é imprescindível que a questão social seja entendida como prioritária. Afinal, o projeto constitucional é um projeto de sociedade justa, solidária e sem desigualdade. Toda e qualquer decisão do poder público deve contemplar os direitos fundamentais e questionar se eles estão sendo atendidos. Não é o que ocorre hoje e isso é visível. É imprescindível, o quanto antes, que os dizeres dos constituintes, do povo soberano, sejam respeitados.
Assinam:
Fábio Konder Comparato, Professor Emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Marcelo da Costa Pinto Neves, Professor Titular de Direito Público da Universidade de Brasília. Foi Conselheiro do Conselho Nacional de Justiça e professor da UFPE, da USP, da Universidade de Frankfurt, da Universidade de Flensberg (Alemanha) e da Universidade de Fribourg (Suíça), entre outras. Doutor em Direito pela Universidade de Bremen, Pós-Doutor em Direito pela Universidade de Frankfurt e pela London School of Economics and Political Science, Livre-Docente pela Faculdade de Direito da Universidade de Fribourg, na Suíça, e Jean Monnet Fellow no Departamento de Direito do Instituto Universitário Europeu, em Florença, Itália.
José Geraldo de Sousa Junior, professor de Direito e ex-Reitor da Universidade de Brasília.
George Rodrigo Bandeira Galindo, Professor de Direito Internacional e Diretor da Faculdade de Direito da UnB.
Vera Karam de Chueiri, Professora de Direito Constitucional e Vice-Diretora da Faculdade de Direito da UFPR.
Calixto Salomão Filho, Professor Titular da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Sérgio Salomão Shecaira, Professor Titular da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Gilberto Bercovici, Professor Titular da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Diogo R. Coutinho, Professor Associado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Marcus Orione Gonçalves Correia, Professor Associado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Jorge Luiz Souto Maior, Professor Associado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Ari Marcelo Solon, Professor Associado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Samuel Rodrigues Barbosa, Professor Doutor Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Virgílio Afonso da Silva, Professor Titular da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Juliano Zaiden Benvindo, Professor de Direito Público da Universidade de Brasília. Doutor em Direito pela Universidade Humboldt de Berlim e pela UnB.
Pablo Holmes Chaves, Professor de Ciência Política da Universidade de Brasília. Bacharel e Mestre em Direito pela UFPE, Doutor em Sociologia pela Universidade de Flensberg.
Ricardo Marcelo Fonseca, Professor da Faculdade de Direito da UFPR.
Alexandre Bernardino Costa, Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília. Doutor em Direito pela UFMG.
Alexandre Veronese, Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília.
Marcelo Cattoni de Oliveira, Professor da Faculdade de Direito da UFMG.
Ricardo Prestes Pazello, Professor da Faculdade de Direito da UFPR, Secretário Nacional do Instituto de Pesquisa, Direitos e Movimentos Sociais (IPDMS).
Daniel Barcelos Vargas, doutorando em Direito na Universidade de Harvard.
Ramiro Santana, Defensor Público do DF. Mestre em Direito pela UnB.
Flávia Carlet, Doutoranda em “Direito e Justiça no Século XXI” pela Universidade de Coimbra
Judith Karine Cavalcanti Santos, Professora da Universidade Católica de Brasília. Mestra em Direito pela UnB.
Fernando Nogueira Martins Junior, Advogado, membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB-MG, Doutorando em Direito na UFMG.
Mayra Cotta Cardozo de Sousa, Assessora Jurídica da Presidência da República. Mestra em Direito pela UERJ.
Gustavo Moreira Capela, Assessor Constitucional da Procuradoria-Geral da República. Mestrando em Direito na UnB.
Érika Lula de Medeiros, Advogada do Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente do DF (CEDECA/DF) e Secretária-Executiva da Rede Justiça e Direitos Humanos (JusDH). Integrante da Assessoria Jurídica Universitária Popular (AJUP) Roberto Lyra Filho, da Universidade de Brasília.
João Telésforo Nóbrega de Medeiros Filho, Mestrando em Direito na UnB, integrante da AJUP Roberto Lyra Filho.
Laís Maranhão Santos Mendonça, Advogada, mestranda em Direito na UnB e integrante da AJUP Roberto Lyra Filho.
Daniel Augusto Vila-Nova Gomes, Professor de Direito do UniCEUB. Mestre em Direito pela UnB.
Humberto Goes Junior, Professor de Direito da Universidade Federal de Goiás.
Pedro Teixeira Diamantino, Professor da Universidade Estadual de Feira de Santana.
Marcelo Cafrune, Advogado, professor, doutorando em Direito na UnB.
João Vítor Loureiro, Assessor Jurídico da Presidência da República, Mestrando em Direitos Humanos na UnB.
Márcio Lopes de Freitas Filho, Assessor Jurídico da Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça.
Hélio Miguel Santos Bezerra, Advogado do Centro de Referência em Direitos Humanos da UFRN.
Natália Bastos Bonavides, Advogada do Escritório Popular e Mestranda em Direito na UFRN.
Daniel Gama e Colombo, Mestre em Direito Econômico pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Lucas Machado Fagundes, Doutorando em Direito na UFSC.
Adaílton Pires Costa, Mestrando em Direito na UFSC.