Battisti e a Revolução

Por Mayra Cotta

O Grupo Brasil e Desenvolvimento participou, nesta semana, do evento “30 anos de Anistia: de Honestino Guimarães a Cesare Battisti”, realizado no auditório Joaquim Nabuco da UnB. O evento faz parte de uma série de atividades inseridas no debate político acerca do pedido de extradição do escritor italiano. A idéia é unir e articular grupos, movimentos e pessoas que, até o momento, se manifestavam individualmente sobre a questão, com o objetivo de formar uma voz única e forte, capaz de atuar politicamente nesta luta.

O primeiro debate, na terça-feira, levou os convidados a discutirem o seguinte tema “30 anos depois: onde estão nossos sonhos e nossas conquistas?”. O reitor da UnB, Professor José Geraldo, discorreu acerca da importância da Universidade, como espaço democrático de discussão e ambiente para o protagonismo social, no debate da anistia. Lembrou, também, a força sempre característica dos estudantes na luta política do país. Paulo Abrão, Presidente da Comissão de Anistia, falou do direito à memória daqueles que desapareceram durante a ditadura brasileira e lamentou profundamente o fato de, nos dias de hoje, ainda haver perseguição política daqueles que lutaram contra os governos autoritários de seus países, como é o caso de Battisti.

A deputada Érika Kokay, militante dos direitos humanos, chamou à atenção para a triste realidade de se ter um cidadão a quem foi concedido direito de refúgio pelo governo brasileiro preso na Papuda há mais de dois anos, correndo o grave risco de ser extraditado. Paique Satarém, membro do Movimento em Solidariedade ao escritor Cesare Battisti, denunciou a covardia daqueles que se recusam a adotar um posicionamento acerca do caso, mantendo-se inertes e afastados da discussão. Por fim, o advogado de defesa Luiz Eduardo Greenhalgh defendeu a importância e necessidade de que o novo Ministro do STF, José Antonio Toffoli, vote no processo de extradição que tramita naquele tribunal, sustentando, ainda, que o Ministro Gilmar Mendes deveria se abster de votar, uma vez que já o fez pela imprensa.

O segundo debate foi realizado ontem e teve como tema “A gota da verdade tem de cair: nossa história de luta não pode ser negada”. O senador José Nery, destacando o caráter de perseguição política da empreitada do atual governo italiano contra Cesare Battisti, ressaltou a importância de envolver mais parlamentares na luta contra a extradição. O advogado de Battisti perante o STF, Eduardo Mendonça, reafirmou os diversos fundamentos jurídicos que impedem a extradição do escritor italiano – a natureza do direito de refúgio como garantia do indivíduo, a mudança súbita de jurisprudência do STF, que, antes, arquivava imediatamente qualquer processo de extradição em caso de concessão do refúgio, a impossibilidade de extradição em caso de crime político e diante da lei anistia brasileira, a fragilidade das provas contra Battisti e a violação do devido processo legal, uma vez que os quatro processos de homicídio contra o escritor italiano foram julgados de uma só vez e à revelia do réu. Por último, Raul Cardoso, militante do B&D, convocou todos os presentes para se unirem ao movimento e participar das diversas atividades que virão por aí, destacando a importância da sociedade civil como ator político neste embate.

Cesare Battisti é um militante que hoje está sendo punido por ter lutado contra um governo com o qual não concordava. É uma pessoa comprometida com um sonho que hoje é perseguida por ter tentado a revolução. Não é nem um pouco fácil lutar para mudar a ordem estabelecida, para transformar a realidade em que se vive. Nenhum homem é capaz de conseguir sozinho. Cientes disso, nós nos juntamos no Brasil e Desenvolvimento, potencializando a vontade e disposição individuais de cada militante na força de um grupo político. E, assim, será feita a revolução planejada.

21 respostas em “Battisti e a Revolução

  1. Bem, considerando que o governo da França ia extraditar o rapaz, que o governo da Itália o quer, e que só o governo da Bruzudanga claudica, não seria hora de darmos uma pitada de razão ao lado que defende a extradição do Battisti?

    E bola-preta, para vocês: muito feio galera do direito ficar fazendo eventos em que não há dialética. Um debate em que todos são favoráveis à mesma posição pode se parecer com tudo, até mesmo com certos programas de pós-graduação, menos com um debate de verdade.

  2. Thiago,

    Afirmar que são “eventos em que não há dialética” é um pouco forte, não? Também não compreendi exatamente a associação com alguns programas específicos de pós-graduação, mas, como não sou da área…
    Não sei se a sua resposta foi dada em um calor de momento. E não sei se você participou do evento citado (eu, não). Talvez tenha sido somente uma crítica breve comportando amplos assuntos. E só. Não sei. No entanto, acho a iniciativa desse evento do Grupo louvável.

    Voltando à questão do caso Battisti, e sendo também um pouco econômico nas palavras, tenho me distanciado do senso feito por alguns setores nacionais de expressão. É aquele lugar comum dos últimos anos: tem-se exorcizado a atuação do estado brasileiro nessa questão por meio de um panorama de discussão exclusivamente político, mitigando o fato de que um governo internacional não pode invadir a competência de outro país. Sinto colocar assim, é uma opinião simplória. Mas sentenciar o Caso Battisti como mais um capítulo de uma gestão de governo perversa, enclausurando o italiano como outra figura relevante em um rol histórico de escândalos na política que habita o Congresso, é material para Folha, Veja e todos aqueles que não largam o pé do Lula, do Tarso, da Dilma (claro, sobra também um comentário incômodo menor para o Serra, a fim de legitimar mais uma vez o debate tão vivo sobre 2010 – má fiscalização da parte desses jornais? Devo reclamar com o Procon?).

    Enfim, vejo aqui uma oportunidade, sinceramente. Não acompanho o blog há muito. Sou leigo, sim. Mas acredito, também, que este espaço está sendo coerente com sua proposta: debater abertamente pontos de vista com organizações sociais, com políticos, com intelectuais. Uma visão imperfeita e provisória, ainda assim. Talvez haja justamente aí um exercício dialético.

    Abraço!

  3. Thiago,

    os maiores defensores da extradição de Battisti, Mino Carta e Maierovitch nunca caietaram o debate, e já foram convidados.

    Agora, dizer que o governo italiano o que e que o ggoverno Chirac ia extraditá-lo é um sub-argumento. Óbvio que se houve o pedido de extradição alguém o quer. Se fosse por isso não haveria o instituto de asilo/refúgio político.

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  5. Thiago, a idéia não era fazer um debate, mas um ato político mesmo. A proposta é lutar contra a extradição e reunir pessoas, entidades e grupos comprometidos com esta causa. O Brasil e Desenvolvimento não é um grupo de discussão, mas um grupo político.

  6. Eu já comentei antes que, embora não tenha gostado da decisão do Genro, por achar que a do CONARE parecia mais bem fundamentada, não cabe ao STF rever esse tipo de ato, praticado pelo Executivo Federal enquanto ente de direito público internacional.

    Tinha dúvidas, então, se o fato de ele ter cometido ou não os crimes alegados era negado ou não pela defesa. O argumento de que a finalidade política dos crimes os justificariam não seria suficiente para mim, dada sua gravidade.

    Depois disso, o Telésforo fez com que eu lesse texto do Barroso sobre o tema, que me fez perceber que o problema era mais quanto à negativa de cometimento dos crimes em si e da presença do devido processo legal nos julgamentos italianos. Tudo parece levar a crer que Battisti foi usado de bode expiatório.

    Concordem ou não com a concessão do asilo – não cabe ao STF rever esse ato e a prisão dele, há mais de 2 anos, é totalmente arbitrária.

  7. Márcio: “o Telésforo fez com que eu lesse texto do Barroso sobre o tema, ”

    [citations needed]

    Pö, Márcio!

    Seja um desavergonhado linkador, hehehe.

    • Como eu sou um ultra-conservador que defende a tradição, sou a favor do governo manter o costume de ser um refúgio de nazistas, terroristas, golpistas e demais -istas, por isso concordo concordo plenamente com a relatora Mayra Cotta. Brasil para cottage!

    • O Barroso, defendendo o Battisti, disse:

      “Battisti foi militante do sonho socialista, que empolgou corações e mentes em outra fase da história da humanidade.”

      Francamente, Márcio. Essa frase, se você chegar perto dela, verá que exsuda sangue. Ela é um desrespeito às pessoas que foram assassinadas ou sofreram o jugo cruel daqueles que estão dispostos a matar e morrer por suas convicções. Esse tipo de certeza estúpido, mecânico e mais digno da formiga do que do homem pensante, que levou jovens sonhadores a abraçar a abominável tese de que fins, desde que suficientemente nobres, justificam todos os meios.

      Espero que esse tipo de mentalidade vá para o lixo da História. Que as pessoas tenham saudáveis dúvidas sobre suas próprias convicções, e jamais estejam dispostas a atirar nos outros por elas.

      • Nesse sentido — estupidez violenta e fanática, em que Deus é substituído por big words como “proletariado” ou “solidariedade” — vejam o que o injustamente bem-reputado intelectual italiano Antonio Negri escreveu, na década de setenta. Tapem o nariz, contenham o nojo, e percebam quão grave era a doença mental que acometeu parte importante da juventude italiana de esquerda na década de setenta e oitenta (eles assassinaram até mesmo um primeiro-ministro, caramba!). Battisti é desse círculo de imbecis fanáticos.

        Negri defecando pela boca, parte 1:

        “Every action of destruction and sabotage seems to me a manifestation of class solidarity…. Nor does the pain of my adversary affect me: proletarian justice has the productive force of self-affirmation and the faculty of logical conviction.”

        Negri defecando pela boca, parte 2:

        “The antagonistic process tends toward hegemony, toward the destruction and the annihilation of the adversary…. The adversary must be destroyed.”

      • Sem entrar no mérito da frase, Thiago, não é adequado fazer as pessoas pensarem que esse é o argumento fundamental utilizado pelo Barroso. A argumentação jurídica em defesa de Battisti exposta nessa nota é sólida.

  8. Estive pensando aqui com meus botões: um tema constante dos filmes americanos mais antigos (ou mesmo mais recentes, como este: http://en.wikipedia.org/wiki/Before_the_Devil_Knows_You're_Dead) é a fuga para o Rio de Janeiro. Você roubava um banco, ou dava um golpe na sua empresa e fugia com sua bela amante para a Cidade Maravilhosa.

    Acho que o caso Battisti e toda a repercussão negativa em torno do caso contribuirá para a ressurreição desse velho meme, que anda meio em baixa.

    A propósito: toda unanimidade é burra. Precavejam-se…

  9. Mayra:
    1-Como um movimento pode se manifestar individualmente?
    2-Você acha que cabe ao executivo ou ao judiciário brasileiros julgar o devido processo da República Italiana? A Itália é ou não é uma democracia? Às vezes sim, às vezes não?
    3-Numa boa, roubar, sequestrar, matar se justificam quando a razão é lutar “contra um governo com o qual não concordava”?

  10. André,

    1- Um movimento se manifesta individulamente quando atua como ente político de form aisolada. Era o que acontecia com o Crítica Radical, po rexemplo, no caso do Battisti.
    2- Acho que cabe ao executivo conceder refúgio a quem é perseguido político. Aliás, a constitucionalidade da lei de anistia jamais foi questionada por nenhum dos lados no caso do Battisti. A decisão acerca do refúgio é do executivo, que, nesse caso, entendeu a atitude do governo italiano em julgar, 30 anos depois, um ex-revolucionário por supostos crimes cometidos durante uma ditadura, à sua revelia e num só arroubo, como perseguição política.
    3- De fato, a campanha da mídia contra o Battisti criou um personagem terrível, um criminoso que merece mesmo é receber toda a fúria de Berlusconi. Lamentável. Na Itália, rebolaram para encontrar provas – que mesmo com muito esforço permancem frágeis – para acusá-lo de quatrop homicídios. Mas como isso não pareceu ser suficiente frente à relevância e solidez que devem ser atribuídas ao instituto do refúgio, o Mino Carta sentiu a necessidade de publicar uma ficha de antecedentes criminais de Battisti, a fim de nos deixar mais tranquilos para atropelarmos uma garantia constitucional.

  11. Mayra: Na Itália, rebolaram para encontrar provas – que mesmo com muito esforço permancem frágeis – para acusá-lo de quatrop homicídios.

    Francamente Mayra. A Itália possui um processo tão complicado e bagunçado quanto o nosso. E mesmo lá, depois de trocentas instâncias, e depois de livrarem por razões processuais um dos co-réus, a justiça italiana continuou achando que Battisti era culpado. Se a Justiça daquele país, mais próxima dos fatos do que a nossa, achou isso, quem somos nós para enfiarmos o bedelho no meio? Queremos que o modelo de impunidade brasileiro para com homicidas se estenda a todos os cantos do mundo? Será este um dos aspectos da internacionalização da justiça?

  12. Mayra: “A decisão acerca do refúgio é do executivo, que, nesse caso, entendeu a atitude do governo italiano em julgar, 30 anos depois, um ex-revolucionário por supostos crimes cometidos durante uma ditadura, à sua revelia e num só arroubo, como perseguição política.”

    Em primeiro lugar, a Itália não era uma ditadura durante a década de setenta e oitenta. Aliás, a última ditadura que por lá passou foi destronada pelos próprios italianos, que executaram o casal Mussolini em 1944.

    Em segundo lugar: o julgamento não ocorreu 30 anos depois. Uma simples lida na wikipedia permite constatar que foi mais de um julgamento, sendo que o de homicídio ocorreu na década de oitenta, com o Battisti revel, pois este preferiu fugir a enfrentar a justiça de seu país.

    E, lembro: a Itália na década de oitenta e noventa — época em que ocorreram os julgamentos — NÃO ERA UMA DITADURA, CARAMBA!

    Estou cansado de dois pesos e duas medidas: se o cara é de esquerda, mesmo que tenha feito grandes sacanagens e crimes, a gente alivia a barra pra ele. É assim, é?

  13. Não mudo uma vírgula no que foi dito pelo Thiago Maciel.

    É sofrível sua argumentação de “democrata” que quer tratar a Itália como se fosse ou tivesse sido em algum momento pós-fascismo uma ditadura. Sinto muito, não foi! (Me pergunto o dia em que este blog vai, como a esquerda da bandalheira já faz, se submeter a comparar a democracia americana ou européia com o moderno regime castrista. Espero que nunca se perca o limite do ridículo).

    É sofrível ter de ler que o negócio é que o Cesare deve “é receber toda a fúria de Berlusconi”. Céus! Pronto, não apenas a Itália é uma ditadura como está nomeado o seu Ditador! E pelo Brasil&Desenvolvimento! Sinto muito, novamente, apesar de ser um tosco, uma figura política nefasta e EM NADA aprovável, ELE NÃO É UM DITADOR. O sr. Cesare será entregue à mesma Justiça que semanas atrás abriu caminho para que o “ditador” seja processado pelo prováveis crimes de corrupção que cometeu.

    É sofrível esse discurso de professorzinho de Ensino Médio de quinta categoria de afirmar que “a mídia criou uma personagem”, “a mídia criou uma opinião”. Use esse discurso/argumento cretino em outra esquina. Não formei minha opinião lendo Veja, assistindo o Jornal Nacional ou pelo que diz Mino Carta (é até hilário citar esse senhorzinho como argumento, ainda mais comigo!) , e imagino que alunos universitários de boa instrução gozem disso: buscar sustentação não só pela mídia, mas por bons livros, boas reflexões, bons filmes, acompanhando discursos, dados, provas, processos, indo aos julgamentos.

    Não adianta muito escrever 500 textos bonitinhos sobre democracia, liberdade e igualdade, praticar por aí exercícios de democratismo e, no fim, se limitar a reinventar os fatos para defender homicidas.

    “Estou cansado de dois pesos e duas medidas: se o cara é de esquerda, mesmo que tenha feito grandes sacanagens e crimes, a gente alivia a barra pra ele. É assim, é?”

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